Um homem branco, com cabelo castanho-claro, óculos e camisa azul bebé, sentado numa cadeira de auditório.
O meu nome é Alexandre Gaspar, tenho neste momento 42 anos. E, atualmente, além de dar aulas de piano, estou a dirigir a escola de música. E também a direção artística do coro d’Os Traquinas.
A parte da deficiência visual é congénita, portanto é de nascença. Daí que ao longo de todo o meu percurso já fiz algumas operações no sentido de fazer pequenas melhorias.
É assim, eu tenho alguns resíduos visuais e que me ajudam a ver, ou melhor, a ver obstáculos ao perto. Mas, por exemplo, uma coisa é aqui na escola, onde é um espaço que eu conheço, e, portanto, ando aqui, e ando a passo largo. Mesmo subir escadas, descer escadas, com instrumentos, tudo e ando a passo largo.
Claro que num local público é um bocado mais complicado, ou seja, ou vou muito mais lento, pronto, para conseguir ter uma noção e não ir contra nada. Ou, aí sim, a forma mais rápida é ir com alguém, e, portanto, estar a ser guiado. Sem dúvida que é mais pratico.
Eu tenho plena noção que para quem veja e depois deixe de ver que é um choque, porque viu a vida de uma forma e de repente dá-se conta com uma limitação. Agora a partir do momento que é de nascença habituaste que o normal é isto, e portanto, é assim e tens que, temos de fazer a estrada desta forma.
Eu acho numa fase inicial sem dúvida que temos de dar mais provas que outros, para mostrar exatamente que somos capazes de o fazer. Mas a partir do momento que saltamos essa fase é igual.
Eu sinto que os meus colegas nem se apercebem. Aliás, tanto não se apercebem que às vezes dão por mim a dizer “olha para ali!” e eu entro na brincadeira “Ali, para onde?”. Às vezes dizem que as senhoras é que conseguem fazer duas coisas ao mesmo tempo, mas é mentira, porque eu também consigo. Eu também consigo estar, por exemplo, eu estou a escrever um email e estou a ter uma conversa com alguém ao mesmo tempo. E é engraçado, colegas que chegam aqui pela primeira vez e estão a falar e eu a escrever no computador, estão a falar comigo e acham que estão a falar para o boneco. Então já é outro colega “Olha, podes falar à vontade que ele está-te a ouvir”.
Eu acho que nós acabamos sempre, lá está, por ganhar depois outras técnicas. Às vezes as pessoas dizem uma coisa que é pura verdade: quando se perde um sentido ganha-se nos outros. E acabo por aperceber-me, por exemplo, de pormenores que se calhar as pessoas no dia-a-dia nem se apercebem. Portanto, de outra forma acabo por tomar atenção a outras coisas que me ajudam.
Se eu pudesse trocar a perda de visão por outro sentido qualquer, por qual é que eu trocava? E eu assim, por nenhum, prefiro assim. Portanto, não, eu acho que a pessoa habitua-se. E pronto, a dada altura habitua-se que isto é a vida normal. Pronto.